Presidente da Eletrobras desrespeita presidente Lula

As últimas semanas não foram boas para o presidente da Eletrobras, Wilson Pinto. Após a decisão do Presidente Lula de colocar a AGU para questionar o processo de privatização e fazer valer a participação acionária da União na empresa, o presidente da Eletrobras percebeu que seu projeto começa a lhe escorrer entre os dedos.


O plano privatista parecia perfeito: uma operação de aumento de capital sem participação da União. Assim seria necessário aportar apenas o suficiente para reduzir a participação estatal para menos de 50%. Mas para evitar que um futuro governo resolvesse fazer valer suas ações, colocaram cláusulas onde, por mais que essa participação fosse significativa (43% no caso), a União não apitasse nada na gestão da empresa. De quebra, viria a descotização, disponibilizando para o mercado livre e a especulação a maior parte da capacidade de geração da Eletrobras e claro, um generoso aumento na remuneração dos administradores que, aliás, permanecem praticamente os mesmos de antes da privatização.


Mas vieram as eleições e o povo resolveu estragar a festa da camarilha que tomou a Eletrobras. Lula foi eleito e começou a cumprir o que estava em seu programa de governo: “Recuperar o papel da Eletrobras como patrimônio do povo”.


Não é só a possibilidade de perder os, agora muito bem remunerados, cargos que tira o sono dessa turma. Eles sabem que a privatização foi um processo cheio de irregularidades e fraudes e que, com a Advocacia Geral da União no jogo, terão que responder por isso. Será essa a razão da Sra. Marisete Dadald permanecer despachando no MME, mesmo sendo administradora de uma empresa privada? Seria para apagar rastros? O fato é que, sentindo a água subir ao nível do pescoço, o Sr. Pinto mobilizou a mídia amiga, em especial a Revista Veja, para desacreditar o governo. Registre-se que a Veja é da Editora Abril que transferiu sua dívida recentemente para o BTG Pactual, protagonista da privatização da Eletrobras.


Primeiro Pinto se disse “triste” com as declarações do presidente Lula e afirmou que “não há necessidade de diálogo com representantes do novo governo para explicar como se deu o processo de desestatização da companhia, uma vez que o hoje ministro de Minas e Energia Alexandre Silveira, era senador durante o processo”. A fala não caiu bem, primeiro porque o atual ministro era suplente à época e porque, evidentemente, não foi o ministro que questionou a privatização, mas o chefe dele, o presidente Lula.


A declaração de Pinto é extremamente grave, não só por ter afirmado categoricamente que não tinha satisfação a dar a um acionista, por sinal o maior deles, mas por ser o Presidente da República, o próprio chefe do poder concedente. Percebendo que tinha ido longe demais na arrogância, Pinto mandou nota à Veja pra tentar consertar o estrago afirmando que: “todo processo de capitalização foi amplamente debatido e aprovado pelo Congresso Nacional e pelo Tribunal de Contas da União (TCU), além de ter sido realizada audiência pública, e o BNDES ter conduzido os estudos…”.


Talvez o processo tenha sido amplamente debatido na Faria Lima, ou nas reuniões entre os oligarcas que hoje controlam a Eletrobras e os membros do governo antinacional de Bolsonaro. Com a sociedade, entretanto, não houve debate. O ex-presidente entreguista, Jair Bolsonaro, afirmou em campanha em 2018, mais de uma vez, que era contra a privatização da Eletrobras. Ou seja, a privatização não foi aprovada pelo principal interessado, o povo. Além disso, a MP da privatização foi aprovada no Congresso sem sequer ter sido instalada comissão mista para sua apreciação e sem que tivesse sido realizada uma única audiência pública, no auge da pandemia. O Sr. Pinto segue equivocado afirmando que a privatização “propiciou uma série de benefícios para toda a sociedade, além de potencialmente aumentar a capacidade de investimento da companhia em mais de três vezes”. Até agora, os únicos beneficiados pela privatização são o próprio Pinto e sua turma. O Sr. Pinto reajustou o próprio salário de R$ 56.000 para R$ 360.000, sem falar nos bônus que podem ser muitas vezes maiores que isso. Já os conselheiros de administração, que antes ganhavam pouco mais de R$ 5.000, agora podem receber até R$ 200.000 mensais.


No que diz respeito a investimentos, basta dizer que até 2015 a Eletrobras investia mais de R$ 10 bilhões por ano, e na Era Pinto, esse investimento não chegou a R$ 3 bilhões por ano. Mesmo agora, após a privatização, a Eletrobras não arrematou praticamente nada em dois leilões de transmissão e um de geração. Ou seja, a estória de privatizar para poder investir é só conversa pra boi dormir.


Tentando rebater a afirmação do presidente Lula de que a Eletrobras voltaria a ser um patrimônio do povo, o Sr. Pinto afirmou que “a Eletrobras continua sendo um patrimônio do país, com conselho administrativo e diretoria compostos por brasileiros”. Pela lei brasileira, uma empresa é patrimônio de seus proprietários, no caso de uma Sociedade Anônima, de seus acionistas. Hoje a maior parte do capital da Eletrobras está em mãos de entes privados e mesmo a parcela considerável que está nas mãos do País, representada pelo estado brasileiro, está esterilizada.


É justamente para isso que o presidente Lula acionou a AGU: fazer valer a participação do estado na gestão dessa estratégica empresa brasileira, podendo, inclusive, designar administradores comprometidos com o projeto de País aprovado nas urnas. Quanto à afirmação pueril de que a direção da empresa é composta por brasileiros, é necessário lembrar que não foram poucos os momentos de nossa história em que traidores da pátria entregaram o País. Não basta ser brasileiro, Sr. Pinto, é preciso defender o País e o que o Sr. e os seus fizeram foi exatamente o contrário disso.


A arrogância do Sr. Pinto não se sustenta em seus resultados. A única coisa efetivamente que ele entregou até agora foi a própria Eletrobras. Não adicionou um único MW de capacidade de geração e nem um km de linha de transmissão novos ao País. Pelo contrário: alienou empreendimentos lucrativos, demitiu mais da metade da força de trabalho e hoje, nem mesmo os acionistas privados têm motivos para estar contentes. No relatório do deputado Elmar Nascimento, relator da privatização na Câmara, previa-se que, no momento da operação, as ações deveriam estar valendo R$ 90. Mas o preço da ação ordinária, no dia da privatização foi de R$ 42 e de lá pra cá, só caiu, chegando a estar cotada a R$ 35, duas semanas atrás.


O modelo de privatização com descotização, que parecia genial em 2016, hoje é um problema. Com o preço do MWh cada dia mais baixo no mercado livre, a Eletrobras se vê com volumes gigantescos de energia descontratada e sem ter para quem vender. De outro lado, o enorme poder de mercado da Eletrobras, controlando quase metade da capacidade de geração hidrelétrica, faz dela um price maker, capaz de ditar o preço da energia no País num cenário de escassez hídrica, que certamente virá no futuro. A verdade é que a privatização da Eletrobras se tornou um jogo de perde-perde. Nem consumidores, nem governo, nem acionistas sérios, com projeto de longo prazo, têm nada de bom a esperar desse desastroso processo.


Já o Sr. Pinto, ao invés de ficar mandando cartinhas para Veja, deveria reconhecer que seu projeto fracassou. Renunciar à presidência da Eletrobras e dar lugar a uma liderança de transição, até que o governo reassuma a Eletrobras e a recoloque nos eixos. O Brasil ainda vai precisar muito dessa empresa!

Fonte: Jornal Linha Viva Nº 1570 de 02 de março de 2023

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