Mais uma vez a região metropolitana de São Paulo foi atingida por um apagão de grandes proporções. Na sexta-feira, dia 11, um forte temporal atingiu a região, derrubando árvores e postes, e provocan¬do o desligamento da energia para cerca de 2 milhões de pessoas. A concessio¬nária local, a ENEL, privatizada, acumula um longo histórico de reclamações dos consumidores. O restabelecimento da energia está sendo tão demorado que no fechamento dessa edição do Linha Viva, em 15 de outubro – 4 dias após o evento climático -, ainda havia mais de 250.000 endereços sem luz.
O desempenho da concessionária pri¬vatizada é tão grave em São Paulo que o ministro de Minas e Energia, Alexan¬dre Silveira, criticou, em nota, a atuação da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) na fiscalização dos serviços da ENEL: “A Agência claramente se mostra falha na fiscalização da distribuidora de energia, uma vez que o histórico de pro¬blemas da ENEL ocorre reiteradamente em São Paulo e também em outras áreas de concessão da empresa”.
Também por meio de nota, no sábado, dia 12, a ANEEL afirmou ter intimado a ENEL a prestar esclarecimentos sobre os fatos e levantou a hipótese de recomen¬dar o fim da concessão da empresa.
De acordo com a Federação do Co¬mércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), o apagão na região teria gerado prejuízos nos setores de varejo e serviços da ordem de R$1,65 bilhão – somente até segunda¬-feira, dia 14. Esse prejuízo deve aumentar até que todas as unidades consumidoras tenham a energia restabelecida.
A população, que depende da energia para executar as atividades mais básicas do dia a dia, ficou revoltada ao ver, pe¬las redes sociais e em emissoras de TV, inúmeras camionetes da companhia de energia paradas dentro do pátio enquanto o caos estava instalado na região. A cena tem explicação: a empresa privatizada tem por política contratar o menor quadro possível de trabalhadores para faturar o máximo. É a famosa política do mais com menos. Enquanto a ANEEL cobrava a ne¬cessidade de pelo menos 2,5 mil funcio¬nários atuando em campo para responder à demanda, a ENEL dispunha, até domin¬go, de apenas 1,7 mil funcionários nas ruas ajudando a resolver o problema. Em meio ao drama e à pressa para solucionar muitos atendimentos em pouco tempo, um eletricista da ENEL morreu enquanto atuava para recuperar a energia no bairro Parque Anhanguera.
Diante do cenário devastador, até mesmo o governador de São Paulo, Tarcí¬sio de Freitas (Republicanos) e o prefeito da capital, Ricardo Nunes (MDB), dois pri¬vatistas de carteirinha, se manifestaram cobrando o fim do contrato de concessão com a ENEL. Eles se somam ao também privatista governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), que, um ano atrás, em entrevista, declarou que foi a “pior decisão do mundo” a venda da CELG em seu estado. Em Goiás, após a venda da CELG, a ENEL assumiu a área de conces¬são e também deixou a desejar no forne¬cimento de energia. Com isso, a Equato¬rial assumiu o lugar da ENEL e também continuou a apresentar problemas e a acumular reclamações dos consumido¬res. A Equatorial é a mesma companhia privatizada que atua no Rio Grande do Sul e que deixou no ano passado consumi¬dores por 12 dias sem energia na região de Pelotas.
A sequência de apagões e inúmeras reclamações Brasil afora sobre as con¬cessionárias de energia mostram que as privatizações do setor não deram cer¬to. A lógica das companhias de energia, quando privatizadas, é cortar custos a todo momento, inclusive demitindo fun¬cionários experientes, com muitos anos de carreira, para maximizar os lucros. Não por acaso, as concessionárias de energia em Minas Gerais (CEMIG) e em Santa Catarina (CELESC) ainda figuram dentre as mais bem avaliadas pelos con-sumidores: pois, por conta de seu caráter público, priorizam o bom atendimento à população em detrimento do lucro a qual¬quer custo. E essa deve ser a lógica de uma concessionária de energia: prestar um bom atendimento à população.
Santa Catarina é um dos estados re¬cordistas de catástrofes climáticas nos últimos anos. De enchentes a tornados, granizo e vendavais, o território catari¬nense já experimentou quase todo tipo de evento da natureza – o que vem au¬mentando com o impacto das mudanças climáticas. Mesmo enfrentando adver¬sidades e eventos extremos, a CELESC consegue atender a população, nos últi¬mos anos, dentro dos limites toleráveis de espera. A empresa chegou, inclusive, a enviar equipes próprias para auxiliar no restabelecimento da energia no Rio Grande do Sul, após a terrível enchente que afetou o estado vizinho no primeiro semestre de 2024.
A situação pela qual vivem os esta¬dos que tiveram suas concessionárias de energia vendidas para o setor privado demonstra que as privatizações no setor foram um erro e que os prejuízos desse erro estão na casa dos bilhões de reais.
É preciso pensar, de forma urgente, em meios de reestatizar não só as con¬cessionárias de energia nos estados, mas também a Eletrobras, que passa por um processo de sucateamento sem precedentes e que já traz consequências negativas a toda a população brasileira. Energia não é mercadoria!